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Acerca da próxima exposição de Tomaz Vieira
Breves anotações sobre o pintor Tomaz Borba Vieira Janeiro 7, 2016 Opinião: Breves anotações sobre o pintor Tomaz Borba Vieira No final de janeiro do ano que agora se inicia, será inaugurada, na Lagoa, a mais recente exposição de Tomaz Borba Vieira. A mostra estará exposta justamente num espaço conventual onde se encontra instalada a biblioteca da qual é patrono. É, aliás, numa das salas desta biblioteca que se encontra aquela que acolhe grande parte do acervo que o pintor doou. José Saramago, escritor que de quando em vez gosto de citar, disse que “todos somos bibliotecas, porque guardamos leituras no nosso interior como o melhor de nós mesmos”. Não só vou ao encontro do seu pensamento, como acredito que podemos conhecer melhor o outro pelos livros que leu. No caso do espólio a que me refiro, a simples leitura dos títulos que figuram nas lombadas remete-nos de imediato para o seu gosto pela arte, educação, história, com destaque para a açoriana, poesia e literatura, no geral. Mas, embora seja interessante conhecer a sua biblioteca pessoal, não é de somenos importante conhecer a sua obra plástica e a sua biografia, muito pelo contrário. O facto de a Lagoa acolher a sua próxima exposição individual, dá-me o pretexto para redigir algumas linhas sobre quem tem o seu nome gravado na biblioteca onde trabalho nos últimos quatro anos. Este pintor nasceu num “sítio onde se cresce a olhar para o mar”, como um dia referiu, ao que acrescento que crescer a olhar para o mar volta-nos para dentro, mas também para fora. Dotado de uma fértil imaginação e criatividade, e também influenciado pelo seu avô, veio a nutrir, desde tenra idade, um forte interesse pelas artes plásticas e literatura. Concluído o curso de Belas Artes, na Escola Superior de Belas Artes em Lisboa, faz um percurso formoso na área da pintura, desenho e gravura. Integra inúmeras exposições coletivas e individuais, não só por Portugal, como também por Florença, Luanda, Suécia, Bermudas e Paris. Uma breve narrativa pelo seu percurso artístico, dá-nos logo conta de algumas das suas referências, quer quando pinta “os Regressantes”, inspirado nos “Emigrantes” de Domingos Rebêlo, quer nos retratos que fez de Dias de Melo e de Canto da Maia. Também, na excelsa tela onde nos apresenta Antero de Quental a ser entrevistado por Rui Galvão de Carvalho, revela a consideração intelectual e estima que nutre por ambos. Esta obra tem a particularidade de a figura do autor entrar nela, representando-se sobre umas andas, o que reforça a importância que o poeta e o professor tiveram na sua formação. É um contador de estórias, não só com as palavras ditas e escritas, mas também com as tintas. Aos meus olhos, uma das suas obras mais belas é justamente a de “Caetaninho da Praia”. Inspirando-se num cantor de ópera, nascido no séc. XIX, em Água de Pau, o pintor apresenta-nos o protagonista, numa noite de luar, como que a uivar e a cantar as que imaginamos ser as mais sublimes e sentidas canções a sós com o mar. O pintor pinta coisas do espírito e da imaginação de uma forma fecunda. Prende-nos com os Serafins. Na série Mulheres com Rabo de Peixe e Homens com Rosto de Cão conduz-nos a um jogo entre o consciente e inconsciente, em que os reflexos das imagens entram numa linguagem erótica. Faz a versão plástica da poesia de Eugénio de Andrade [1], aborda o universo denso de Kafka nas suas gravuras [2]. A ilha de que não se desenraizou é pintada por si de várias formas: emalada, fechada, liberta, telúrica. Ingressa num discurso plástico, fortemente escultórico das letras que, geometricamente apresentadas, nos deixam entrever outros símbolos. No fundo, e apropriando-me das palavras de R. Ciabani, o pintor “desenvolveu um alfabeto próprio, possui dotes fundamentais: o de reportar-se ao seu tempo, encontrando uma linguagem pessoal” [3] . Esta pluralidade temática e artística leva-me a recordar a fala de Victor Almeida, outro artista plástico nascido desta terra, que disse que Tomaz é “um artista completo, um dos mais completos”. É certo que suas obras podem ser olhadas, com olhos de ver, em inúmeras coleções, aquém e além-mar. Mas aconselho vivamente a que, no penúltimo dia do mês de janeiro, quem me lê, suba a escadaria que conduz até ao Convento dos Franciscanos, para contemplar a exposição “Pernalta”. É que nestas catorze obras, algumas a lembrar uma dança, é-nos emprestada a experiência do belo, da leveza e do voo. _____________________________________________ [1] 1979. [2] 1968. [3]R. Ciabani, exposição em Florença, 1967 Jornal Diário da Lagoa Texto: Teresa Viveiros Crónica na edição Impressa de Janeiro de 2016.